Juíza suspende sessão após discussão com promotor: “Quem manda sou eu”

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Vídeo mostra discussão entre a juíza Bruna Fernanda Oliveira da Costa (dir.) e o promotor Márcio Antônio Alves de Oliveira (esq.) em Cantanhede, no interior do Maranhão

Desentendimento ocorreu por disposição de cadeiras; segundo a magistrada, atitude do promotor tem “elementos de violência de gênero”

A juíza Bruna Fernanda Oliveira da Costa suspendeu na 4ª feira (14.mai.2025) uma sessão do tribunal do júri da comarca de Cantanhede, no interior do Maranhão, depois de uma discussão com o promotor de Justiça Márcio Antônio Alves de Oliveira. …

Antes do início formal da sessão, que julgaria um caso de homicídio, o promotor exigiu que a secretária judicial, que assessorava a juíza, desocupasse uma cadeira posicionada imediatamente ao lado direito da magistrada, alegando que ele deveria ocupar aquele assento.

“Quem vai ficar aqui me assessorando é minha secretária. Se você quiser ficar ali, mais para o fim da mesa, você fica. E eu vou estar obedecendo a lei, porque a lei fala à direita. Aqui é à direita”, afirmou a juíza segundo vídeo divulgado nas redes sociais. “Aqui, quem manda sou eu. Você é parte, advogado é parte, e eles são jurados, combinado?”, acrescentou a magistrada, que presidia a sessão.

A magistrada disse também que o promotor já havia “tumultuado” outras sessões. “Pelo amor de Deus, colabora. A sociedade precisa disso. E você está aqui para representar a sociedade. Você não está aqui para causar confusão e para ficar aqui quase sentado no meu colo”.

Diante da recusa do promotor em se levantar, a juíza deixou a sessão dizendo: “Palhaçada”.

Durante cerca de 7 minutos, o promotor justificou sua atitude com base em normas, como a lei complementar 75 de 1993, que afirma que é prerrogativa do Ministério Público “sentar-se no mesmo plano e imediatamente à direita dos juízes singulares ou presidentes dos órgãos judiciários perante os quais oficiem”.

“Não estou aqui, senhores, tumultuando nada. Trabalho aqui na Comarca há quase 5 anos”, disse. “Se a lei determina que o promotor de Justiça senta à direita do juiz, imediatamente à direita, a lei tem de ser cumprida. Se a juíza não cumpre essa lei, que me cabe fiscalizar, e eu não faço nada, eu me torno omisso”.

Depois, a juíza retornou à sessão e, usando o seu microfone, desejou bom dia aos presentes. Diante da interrupção da magistrada, o promotor reclamou, e a juíza voltou a pedir que ele afastasse sua cadeira.

“Eu peço desculpas pela situação criada aqui pela promotoria. Infelizmente, não vai dar para prosseguir com o julgamento com essa atitude, destratando, primeiramente, a minha funcionária, depois, destratando a magistrada, presidente do júri, me impedindo de sentar na minha cadeira”, afirmou Costa. Enquanto a juíza se pronunciava, o promotor apontava para a cadeira da magistrada, indicando que ela estava vazia.

A magistrada acrescentou que o ocorrido ficaria registrado em ata e seria informado à Corregedoria do Ministério Público.

“A gente está vendo que tem inclusive elementos de violência de gênero aqui, porque enquanto os juízes da comarca foram homens, tudo andava muito bem”, disse a magistrada. “Por conta dessa atitude desrespeitosa, afrontosa, não há condições da presidente da sessão pôr ordem e dar andamento aos trabalhos. Peço desculpas”.

Procurado pelo Poder360, o promotor Márcio Antônio Alves de Oliveira encaminhou uma nota oficial divulgada pela Associação do Ministério Público do Estado do Maranhão, que manifestou apoio à sua conduta.

“Desde o início de sua trajetória, o Dr. Márcio tem demonstrado atuação comprometida com os valores republicanos, com o zelo pelo interesse público e com o respeito aos direitos fundamentais, notadamente nos trabalhos realizados junto à Promotoria de Justiça de Cantanhede. Seu histórico funcional é marcado por firmeza de propósitos, senso de justiça e notável espírito de cooperação institucional, como se depreende da vasta atuação extrajudicial e consensual registrada em sua manifestação à Corregedoria-Geral do MPMA”, escreveu a associação. Leia a íntegra do documento (PDF – 420 KB).

No caso ocorrido em 14 de maio em Cantanhede, segundo a manifestação de apoio, “a atuação do referido promotor limitou-se ao exercício regular de prerrogativa legalmente assegurada pela Lei Orgânica Nacional do Ministério Público (Lei 8.625/1993, art. 41, XI) e reafirmada pelo Supremo Tribunal Federal na ADI 4768, que reconheceu como legítimo o assento do membro do Ministério Público à direita do juiz presidente, no mesmo plano de julgamento”.

O documento acrescenta que “lamentavelmente, a Ata de Audiência registrada de forma unilateral — sem assinatura de qualquer outro presente — apresenta uma narrativa que não corresponde à realidade dos fatos, imputando ao membro do Ministério Público uma conduta que, além de não comprovada, é frontalmente desmentida pela filmagem da sessão, cujas imagens demonstram, ao contrário, elevação de tom por parte da magistrada e uma condução que destoou do espírito de diálogo e harmonia esperados no ambiente judicial”.

Fonte: https://www.poder360.com.br/